Explicações!

Andei um bom tempo egoista. Escrevi só pra mim e só eu saboreei meus textos. E quando menos esparava e vindo de onde eu menos esperava, me cobraram explicações: "Tu abandonou o blog?"
Não, mas achei que ninguém mais lia.
Agora que sei que alguém lê, volto a publicar minhas confusões mentais.
Aproveitem (ou não).
Sal.

Os livros

Senti um cansaço percorrer os músculos das pernas. Puxei uma cadeira e sentei-me perante os livros. Uma imensa biblioteca se jogou à minha frente. Os livros empoeirados despertavam minha atenção. Alguns muito lidos, outros nem tanto. Alguns com belas capas e muito finos, outros quase sem cobertura e imensamente grossos. Estiquei as pernas. Passando a mão pelo lado de fora da coxa direita, vi um papel embaixo da mesa. Estiquei-me, daquele jeito que ficamos quase prontos a perder o ponto de equilíbrio e cair, peguei o pedaço de papel rasgado pela ponta dos dedos esquerdos. Completamente amassado, pude ler no papel: “Comece pelos livros da prateleira mais alta, canto direito, Livro do dia e Livro da noite, autor desconhecido. Escolha o livro compatível com o horário em que você se encontra”. Reclinei a cabeça, era realmente alta a prateleira. A dor nas pernas diminuía. Peguei a escada e depois de muito esforço, mesmo estando no degrau mais alto, retirei os livros. Era noite e por profunda teimosia resolvi abrir o Livro do dia. Uma capa preta, escrita em letras douradas. Os livros eram finos e muito velhos. As páginas marcadas, amassadas, demonstravam o seu uso excessivo. Abri. LIVRO DO DIA Primeira página: LIVRO ERRADO. Senti um calafrio percorrer a espinha. Mesmo assim continuei folheando. Segunda página: O TEMPO NÃO É UMA INVENÇÃO. VOCÊ VÊ A LUA OU O SOL? Assustei-me. Achei que era uma piada intrigante. Talvez o outro livro fosse igual. Passei os dedos pela folha muito amarelada. Corri para o meio do livro. Nada. Estava em branco. Completamente vazio. Apenas as duas primeiras páginas. Sorri. O outro seria igual. Troquei de livros. LIVRO DA NOITE Primeira página: 23:59H. ESTE LIVRO FOI ESCRITO DE TRAZ PARA FRENTE. E COMEÇA PELO EXATO SEGUNDO EM QUE VOCÊ O ABRIU. Fechei o livro. Olhei para o relógio de parede antigo, feito de madeira de lei e badalo de ouro, estilo Art Noveau. Não tive coragem de fitar os ponteiros. Olhei novamente para o livro e, então, o relógio soou. Doze badaladas seguidas. Doze assustadoras badaladas. Abri o livro pela ultima página, ainda assustado com o que acontecera. Fui folheando de traz para frente até achar o primeiro capitulo. Primeiro capítulo: VOCÊ NASCEU DE UMA SEMENTE. Li o capitulo de umas 30 páginas. Chorei. Ele dizia como foi o momento do meu próprio nascimento. E assim as horas se passaram. Não pude desgrudar do livro e quanto mais lia, mais parecia que o livro criava capítulos. Tive a chance de analisar minha vida novamente. Exatamente tudo o que eu fizera estava ali. Tudo. Tombos, tropeços, fracassos. Recuperações, sorrisos e conquistas. Pude recordar de fatos que não me lembrava há muito. E de forma estranha, mas resumida, minha memória ia jogando os acontecimentos em minha face. O relógio badalou sete vezes. O livro perdeu as letras. Ficou completamente branco. A essa altura tudo era normal. Percebi que o sol nascera. Voltei para o começo. Primeira página: LIVRO ERRADO. Percebi que não era uma brincadeira. Segunda página: O TEMPO NÃO É UMA INVENÇÃO. VOCÊ VÊ A LUA OU O SOL? Troquei de livro. LIVRO DO DIA Primeira página: 07:02H. ESTE LIVRO FOI ESCRITO DE TRAZ PARA FRENTE. E COMEÇA PELO EXATO SEGUNDO EM QUE VOCÊ O ABRIU. Como já sabia o procedimento, fui direto para o fim. E folheei até encontrar a parte onde parei. Nessa confusa leitura passei por várias trocas entre os livros. Até por fim chegar ao último capítulo. Olhei para o título. Chorei. Mas não havia volta: VOCÊ DEVERIA SABER QUE ERA O FIM. Percebi que minha vida passara por mim e nunca notei o quanto fiz e o quanto deixei de fazer. Tentei rasgar o livro. Não tive forças. Tentei jogá-lo longe. Meus braços fraquejaram. Mal podiam segurar os livros. Então percebi que a segunda página do livro errado me dizia a verdade:O TEMPO NÃO É UMA INVENÇÃO. VOCÊ VÊ A LUA OU O SOL?

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